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#ESTUDEOFUNK: CONHEÇA UM POUCO MAIS SOBRE O PROJETO QUE ESTÁ MOVIMENTANDO A CENA DO FUNK CARIOCA
Por: Amanda Rocha
A Fundição sempre esteve de braços abertos para receber as mais diversas manifestações culturais e artísticas, e é óbvio que o Funk nunca esteve de fora dessa. Com o objetivo de disseminar este ritmo e enriquecê-lo ainda mais o projeto #estudeofunk foi criado pela casa e recebe dezenas de jovens diariamente para uma imersão e residência em um estúdio estruturado e equipado para o desenvolvimento de conteúdos musicais e audiovisuais.
Os artistas selecionados para participar do programa têm acesso a aulas, mentorias e muitas outras atividades em um espaço exclusivo para o crescimento de suas músicas, danças, beats, e movimentações artístico-culturais.
Nascida no bairro do Fonseca, em Niterói, MC Marie é um dos grandes talentos do #estudeofunk. A jovem de vinte e sete anos é formada em Artes pela UFF, mas sempre fez Funk em sua roda de amigos e nutria o sonho de ser funkeira. Foi durante a pandemia que a MC começou a correr atrás do que realmente queria profissionalmente e se dedicou à sua música, lançando seu primeiro clipe no dia da visibilidade lésbica (29 de agosto), data significativa para ela, que se identifica, assume e define sua identidade como mulher sapatão.
Reprodução/Instagram: @_mcmarie
Marie contou que abandonou seu emprego com o audiovisual para estar no projeto e se sente feliz com esta decisão.
“‘Gosto Muito’ mudou minha vida, lançar Funk mudou a minha vida. Por mais que seja um corre e eu tenha agora o #estudeofunk para fazer essa residência, eu larguei o que me dava dinheiro: o meu trabalho com o cinema e audiovisual. Mesmo sem dinheiro eu me sinto bem e plena. No geral, eu sinto que estou seguindo os meus sonhos e construindo uma coisa que vai ser muito maior pra mim.”
ASSISTA AO CLIPE DE 'GOSTO MUITO'
O Funk sempre esteve presente na vida de Marie, em seu dia-a-dia e em diversos momentos de sua história. A artista compartilhou uma lembrança de sua infância onde percebeu que o ritmo não era bem aceito fora de sua bolha familiar e do território onde morava.
“Tem uma situação que eu lembro sempre: no dia do profissional na escola quando eu era criança, a minha mãe não tinha profissão formal e cada responsável tinha que ensinar alguma coisa na escola, passar um pouco do seu trabalho para as outras crianças e a minha mãe deu uma aula de Funk e eu estudava em um colégio particular nessa época. Eu lembro das mães tirando os filhos da aula. Minha mãe foi de sainha, com um radinho, soltou o CD da Furacão e começou a ensinar a dançar Funk. Os pais começaram a tirar os filhos e eu fiquei muito feliz na aula da minha mãe. Nesse dia eu entendi que nem todo mundo gostava do Funk, que ele estava num lugar de exclusão social e não era bem aceito por todo mundo.”
Com letras que enaltecem e dão voz para experiências lésbicas, Marie conquista seu espaço e representa mulheres que amam outras mulheres de forma real e sincera.
“Eu faço o Funk que eu sempre quis escutar. Eu sou sapatão desde que eu tenho doze anos, me assumi sapatão com doze anos, sempre tive relação com mulheres, então eu faço um Funk que represente a minha vivência. Eu crio a representatividade no Funk que eu nunca tive.”
Marie disse que uma de suas maiores motivações para continuar neste caminho é a vontade de dar uma vida melhor e mais confortável para sua mãe e que o #estudeofunk tem sido um grande suporte para a realização de seus sonhos.
“Eu quero dar descanso para a minha mãe, eu quero crescer com a minha arte, ganhar dinheiro com o que eu gosto de fazer e prover para a minha mãe fartura, descanso, paz, saber que a gente vai ficar bem. O EOF está sendo tudo pra mim, desde que eu conheci o projeto e me inscrevi, me sinto muito mais perto de realizar os meus sonhos. Eu não tinha nenhum suporte até encontrar o projeto e não só sobre isso, eu estou com um monte de gente que também quer realizar os seus sonhos no Funk. Para além de ser só o meu sonho, estou com várias pessoas que têm a mesma fome de criar e que querem produzir Funk, eu nunca tinha vivido nada parecido com isso e nem achei que ia viver. O projeto está me ensinando muito e é uma esperança para mim, eu tenho um espaço que acredita no Funk e valoriza o Funk.”
Outro nome entre os artistas do #estudeofunk é o DJ Gordinho do Confia. O morador da Comunidade da Rocinha que se apresenta orgulhosamente como pai do Bento, teve seu primeiro contato com a arte de ser DJ muito jovem e hoje está consolidando sua carreira e confirmando seu talento em Bailes Funks do Rio de Janeiro.
Reprodução/Instagram: @djgordinhorc
O DJ contou que teve alguns tropeços no meio do caminho, mas não desistiu de sua arte, continuou lutando por seus sonhos e teve apoio de familiares e amigos.
“Quando eu tinha meus treze para quatorze anos eu ia muito na casa do DJ novinho, meu amigão aqui na comunidade, minha família praticamente. Ele produzia e tocava em bastante eventos, eu ia com ele pra acompanhar, ajudava até a carregar o som e eu fui me interessando muito nessa parada de DJ. Nesse lance de produção, vi que Deus tocou na minha vida e viu que isso era pra mim, cheguei até a tocar num lugar e minha mãe ir me buscar porque ela não gostava, era muito envolvimento com certas coisas... Não gostava realmente desse vínculo. Quando fiz meus 15 anos, minha mãe faleceu, e fui morar com meu tio lá em Nilópolis. Lá eu conheci uma rapaziada chamada Família Brinquedo e também uma rapaziada na Nilo Peçanha, pessoas que me davam um apoio e me ajudavam me colocando em eventos. Tocava com um notebook da minha prima. Teve uma vez que meu tio escondeu, peguei escondido, e ele não gostou, foi uma k.ozada. Precisei voltar a morar na Rocinha sozinho, com minha tia sempre me dando um apoio.”
ACOMPANHE O TRABALHO DO DJ GORDINHO
Depois de passar por um período difícil, DJ Gordinho do Confia conseguiu se reerguer e firmar-se como DJ residente de dois grandes bailes da cidade.
“Comprei um iPad pra mim e arrumei uma vaga no baile da comunidade, o Baile de Moscow, onde hoje em dia sou um dos DJs residentes, assim como no Baile do Boiadeiro. Fui seguindo nessa minha vida e nessa carreira que sempre admirei e gostei, fiz uma amizade muito forte com o Pablinho Fantástico e WB Negão, que me deram uma outra oportunidade: ser DJ do Grupo Oz Crias. Dou muito valor pra isso e agradeço muito a Deus por todas as oportunidades e chances que Ele me deu.”
Para o artista, o projeto representa muitas coisas positivas e proporciona para ele a sensação de estar em casa.
“Pra mim o #estudeofunk representa, fé, alegria, coletividade, aprendizado, conhecimento e o principal: muito amor de todos. Me sinto muito bem quando eu vou, como se eu estivesse em casa”
MC ChaChá também está entre os artistas que somam com o projeto. O cantor começou sua carreira no Baile da Espanha, e apesar de, no início, seguiu em frente participando de alguns eventos até conseguir lucrar com sua arte. Logo após dar o pontapé inicial na música, ChaChá foi preso e por quase dois anos teve sua caminhada interrompida.
Reprodução/Instagram: @mcchachazonasul
“Fui preso injustamente, acusado de uma série de assaltos em Copacabana, do nada. Meu nome já circulava em rodas de rima, eu sempre gostei do freestyle. Canto há quatro anos e fiquei quase dois anos parado. Escrevi muito na cadeia, era meu passatempo, comecei a escrever para mim, pensando no meu futuro para quando eu chegar na pista, cantar tudo isso que eu passei.”
Nos quase dois anos que passou na cadeia, o MC se dedicou a escrever “Parei de Traficar”, sucesso que virou clipe gravado em sua comunidade e conta a história de um homem que deseja sair do tráfico. A inspiração para essa composição surgiu das histórias e vivências de outros detentos.
ASSISTA AO CLIPE DE 'PAREI DE TRAFICAR'
“O #estudeofunk para mim significa muita coisa, eu tô podendo me expressar, eu posso falar do jeito que eu quiser, ninguém me discrimina pela minha gíria, pelo meu jeito de falar. A prisão ofuscou muito o meu lado artista e o EOF tá me dando essa visibilidade, as pessoas estão associando a minha letra à minha imagem. Só tem gente fera e a vitória é de todo mundo.”
Muito apegado a sua fé e acreditando num futuro melhor para si e para todos, Chachá deixou sua mensagem de prosperidade e incentivo.
“Eu tenho o meu axé, cultuo o Candomblé e tenho fé em Deus acima de tudo, acredito que nada é em vão. A menorzada tem que olhar pra frente, não desistir do sonho. Se estamos aqui vivos hoje, não é porque algo vai acontecer. A oportunidade é única e o papo que eu quero deixar é que o muito nunca vai ser o bastante e a primeira vez pode ser a sua última chance. Muito axé e salve a malandragem!”
O segundo ciclo do #estudeofunk está com inscrições abertas no site do projeto até o dia 29 de agosto. Se você é ou conhece algum artista, não perca tempo e se increva! Serão cinquenta selecionados entre MCs, DJs e dançarinos.